Ilustração gerada por Vitor Dornelles com auxílio de Inteligência Artificial (Stable Diffusion)

O dia em que eu expulsei uma velha escrota do mercado

Vitor Dornelles
3 min readSep 12, 2022

Era domingo, e eu tinha ido ao mercado escolher legumes para o almoço, quando comecei a ouvir uma gritaria perto da entrada, a alguns metros de onde eu estava. Identifiquei que os gritos tinham origem em uma senhora, provavelmente por volta dos 60 anos de idade, que ameaçava uma das atendentes do local:

— Se você fizer isso de novo, eu vou tacar estas garrafas de azeite na sua cabeça, entendeu??

Aqui devo avisar que eu prefiro evitar conflitos e interações, a ponto de já ter visto uma pessoa cair bem na minha frente e ter como reação instintiva simplesmente desviar e continuar andando. Portanto, o que relato a seguir não tem o objetivo de "sinalizar virtude", uma vez que não me considero nada virtuoso. Eu simplesmente percebi que ninguém em volta ia fazer nada e tinha basicamente sobrado para mim.

Depois de alguns segundos de hesitação, larguei minha cesta no chão e me dirigi ao epicentro da confusão. Chegando lá, cutuquei a senhora esbravejante, de modo a desviar sua atenção para mim. Assim que me viu, ela ficou pálida e mudou de tom. Provavelmente não esperava ser confrontada, e talvez já tivesse até mesmo o hábito de humilhar funcionários do mercado sem sofrer consequências. Depois também pensei que o mero fato de eu ser um homem de 1,90m deve ter sido o suficiente para intimidá-la. Imediatamente, começou a se fazer de vítima.

— Ela faz isso sempre, e eu sou diabética!

Pensei: eu também sou diabético e não fico ameaçando quebrar garrafas de vidro na cabeça das pessoas. Mas me limitei a responder:

— A senhora vai parar de ameaçar a funcionária AGORA!

Ela continuou tentando se justificar, mas eu não estava interessado em ouvir quais eram suas desculpas para as ameaças de agressão. Cortei-a novamente e desta vez fui mais incisivo:

— Eu aconselho a senhora a ir embora antes que eu chame a polícia!

Nesta hora eu me posicionei entre ela e a funcionária ameaçada, de modo a ficar de costas para esta e de frente para a velha. Foi neste momento que eu vi os adesivos que ela trazia colados na blusa, e é agora que você pode ter certeza de que eu não inventei uma linha sequer desta história, porque o que eu vi foi tão clichê que se eu estivesse escrevendo uma ficção ficaria com vergonha de incluir essa parte. Mas o fato é que, sim, AINDA POR CIMA a velha escrota ostentava no peito dois adesivos em apoio a Bolsonaro.

Vendo que o resto do mercado estava claramente do meu lado, a desagradável senhora começou a se afastar cada vez mais, repetindo lamúrias sem sentido, como se fosse a grande injustiçada da situação, e sumiu em direção à saída.

— Isso, vai embora daqui!, eu dizia enquanto ela se afastava cada vez mais rápido.

Após o entrevero, ninguém aplaudiu nada. E eu tampouco fui perguntar para a atendente como ela estava, pois entre as virtudes que me faltam está também a empatia. Simplesmente voltei para a minha cesta — tremendo com a adrenalina que tinha sido descarregada no meu corpo para que eu pudesse meter um golpe do Zangief caso alguém tentasse interceder pela velha — e continuei a escolher cebolas. Ao meu lado, uma mãe tentava explicar para o filho pequeno o que tinha acontecido:

— Era uma mulher maluca!

Acho que ela resumiu bem.

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