Luke Jenner no Circo Voador (RJ) em 2012. Foto: Vitor Dornelles

The Rapture no Rio: faltou o arrebatamento

Vitor Dornelles
5 min readAug 17, 2020

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Publicado originalmente em janeiro de 2012 no (agora extinto) site LineUp Brasil

O Circo Voador estava praticamente vazio quando cheguei, o que me deu tempo para pensar no primeiro — e único — show do Rapture a que tinha assistido até então. Tinha sido em 2003, na mesma cidade do Rio de Janeiro, quando eles se apresentaram no — agora defunto — TIM Festival, na mesma noite que White Stripes e Super Furry Animals. Por algum motivo, as performances desses dois me marcaram muito mais do que a do Rapture. O White Stripes porque fez um show enérgico, sujo, tenso. Enfim, o que se costuma chamar de “showzaço”. Já o Super Furry Animals foi memorável não só por causa das ótimas músicas, mas especialmente pelas papagaiadas, como no momento em que se vestiram de monstros peludos. Mas e o Rapture? Confesso que não me recordo de muita coisa, fora a empolgação da platéia durante o hit “House of Jealous Lovers”. Ah, claro, e a cabeleira “proto-Marc Bolan” de Luke Jenner.

É engraçado ter tão poucas lembranças daquele show. Naquela ocasião, o Rapture estava na, digamos, crista da onda. O disco “Echoes” tinha recebido resenhas incríveis da imprensa musical. Tanto que, meses depois, o álbum seria eleito o melhor do ano pelo site americano Pitchfork. Justificando a escolha, o resenhista Ryan Schreiber escreveu: “Nada é mais 2003”. E, de fato, embora hoje em dia isso não queira dizer muita coisa, o Rapture definia bem o espírito da época.

E agora cá estamos, quase nove anos depois, num palco bem menor do que aquele do TIM Festival, aguardando um show bancado pelos próprios fãs da banda. Os shows promovidos pelo Queremos têm a fama de ser especiais. Geralmente emocionados com a iniciativa, os artistas costumam se esforçar mais do que o normal para agradar a plateia. Não duvido que no último ano, sob a lona do Circo, muitas pessoas tenham presenciado o que viriam a chamar de “show da minha vida”. Desde o longínquo ano de 2003 o Rapture lançou mais dois álbuns. Ambos muito bons, mas que não alcançaram o mesmo nível de excitação do “Echoes”. O que eles teriam reservado para esta noite? As notícias sobre o show de São Paulo, ao menos, eram as melhores possíveis.

The Rapture no Circo Voador (RJ), 2012. Foto: Vitor Dornelles

O tempo chuvoso parecia ter desanimado parte do público, pois, embora a pista estivesse bastante cheia, sobrava espaço no mezanino. Antes que pudesse continuar minhas divagações sobre a lotação do local, porém, a banda foi entrando no palco, aos poucos. Primeiro Gabriel Andruzzi, tocando as primeiras notas de ”In the Grace of Your Love” e, progressivamente, os outros três membros da banda. Por último, obviamente, o vocalista Luke Jenner. O público recebeu os americanos calorosamente e assim permaneceu na seqüência com “Never Die Again” e “Pieces of the People We Love”. Já na quarta música, “Get Myself Into It”, a plateia pareceu ter ganhado um gás extra e, pelo menos a julgar pela galera das primeiras filas, pulou bastante.

Gabriel Andruzzi no Circo Voador (RJ), 2012. Foto de Vitor Dornelles

Depois de uma esfriada com “The Devil” e “The Killing”, Luke Jenner finalmente se dirigiu ao público para anunciar “Whoo! Alright-Yeah… Uh Huh”, que foi bem recebida pelos cariocas e emendou no mega-hit “House of Jealous Lovers”, que pareceu ter acordado a porção do público que estava mais atrás, até então um tanto tímida. Nesse instante, Gabriel Andruzzi sacou seu cowbell e foi se juntar aos outros três membros da banda no centro do palco. E lá ficaram os quatro durante a maior parte da música, num dos poucos momentos realmente empolgantes da apresentação.

Depois deste clímax, o show seguiu calmo até “Sail Away”, do disco mais recente, e “Echoes”, do sucesso de 2003, que precederam o bis. Quem leu alguma coisa sobre os shows do Rapture na América Latina deve ter percebido que os setlists dos shows são exatamente iguais. Logo, se não houvesse uma surpresa à la “show do Queremos”, seria fácil adivinhar o que viria depois. E, de fato, a seqüência final de músicas não fugiu ao script, o que contribuiu para deixar a apresentação um tanto burocrática. Luke Jenner, pouco falante durante toda a performance, agradeceu ao público antes de tocar as dançantes “Children” e, na seqüência, “Miss You” com sua introdução classuda de baixo.

Luke Jenner (2012). Fotos: Vitor Dornelles

Antes da última canção, Jenner agradeceu novamente ao público, desta vez por terem “comprado” a banda — em referência ao sistema de cotas do Queremos -, e aí sim começou o momento de maior catarse, com “How Deep Is Your Love”, o hit atual do grupo. Nessa hora deu para perceber a banda realmente feliz e mais solta, algo que não transpareceu no resto da apresentação. Enquanto o público batia palmas e cantava os versos “Let me hear that sooooong” (que eu sempre emendo mentalmente com “Thong Song”, do Sisqó, mas talvez isso seja uma coisa minha), bateu uma certa frustração de que, justamente quando o show parecia engrenar, ele chegaria ao fim. E foi o que aconteceu. Após o solo de sax de Gabriel Andruzzi, a banda se retirou do palco, sem maiores despedidas.

Vídeo: Vitor Dornelles

É possível que para os fãs que pagaram para trazer a banda tenha sido uma noite inesquecível. Afinal, o Rapture tem músicas excepcionais, Luke Jenner canta bem e os outros instrumentistas são bastante competentes. Porém, fica a sensação de que, se fosse simplesmente um DJ tocando um mix de canções dos americanos, a noite não teria sido menos divertida. Foi legal? Claro. Mas, assim como em 2003, o Rapture falhou em fazer um show realmente memorável.

Vito Roccoforte na bateria (2012). Foto: Vitor Dornelles

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